Energia limpa e confiável

Opinião
03/02/2006 16:04

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Arnaldo Jardim<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/03-2008/ajardim.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a>

Em seu discurso anual do Estado da União, em que o presidente norte-americano apresenta as metas do seu governo para o Congresso e o Senado, George W. Bush surpreendeu ao anunciar que pretende combater "o vício dos EUA por petróleo" por meio de incentivo às fontes renováveis de energia, com o propósito de diminuir em 75% as importações deste combustível até 2025. O discurso cede aos anseios da União Européia e da crescente consciência ambiental internacional e pode ser um sinal do começo de um novo ciclo energético mundial.

É notório o meu compromisso com o desenvolvimento de fontes alternativas de energia, particularmente com as limpas e renováveis. Na Assembléia paulista, coordeno a Frente Parlamentar que trata deste assunto, onde assumi uma postura de vanguarda pró-ratificação do Protocolo de Kyoto, o que desencadeou uma série de iniciativas no sentido de estarmos sintonizados com os desafios impostos pelas mudanças climáticas. Cobrei, vigorosamente, o governo federal para que implantasse o Proinfa (Programa de Incentivo às Fontes Alternativas) e alertei, na ocasião da sua implementação, que a baixa valorização não impulsionaria a produção da energia oriunda da biomassa.

Saudei, quando a nossa diplomacia colocou na pauta de negociações de diversos fóruns internacionais, a necessidade de uma participação cada vez maior dos renováveis na matriz energética mundial. E alertamos para o risco da dependência do combustível fóssil e a premente alta nos preços. O que muitos tacharam como uma avaliação "terrorista" acabou se confirmando, de forma inexorável, com o preço do barril atingindo os US$ 70.

Todo este entusiasmo se desdobrou na questão do álcool combustível. Testemunhamos o início e o grande tropeço do Programa do Álcool, e com empolgação o vimos ressurgir com vigor, de 1999 para cá, tornando-se uma realidade indiscutível. Mais do que isso, acompanhamos a evolução tecnológica que possibilitou o surgimento do motor flexível, que além de impulsionar o mercado interno, abriu novas perspectivas internacionais para o uso do nosso etanol " o combustível mais limpo do mundo -, com o melhor balanço energético, o mais barato, gerador de empregos e de alternativas de desenvolvimento para o País.

Por isso, me sinto na obrigação de fazer um alerta que transcende a aflição recorrente do período de entressafra, quando se discute o preço momentâneo do álcool, muitas vezes ignorando o jogo do mercado. Momento, no qual, questiona-se a disponibilidade do combustível sem realizar medidas mais estruturadas, como estoques reguladores, mecanismos de financiamento e contratos de compra e venda que evitassem a grande oscilação de preços ao longo da safra.

Porém, reivindico uma reflexão mais aprofundada que faça claro diagnóstico, saia do emergencial e formule propostas mais duradouras, consolide instâncias e defina uma estratégia para o álcool combustível, pois sem isso acredito que, a médio prazo, comprometeremos a sua credibilidade.

A produção de carros de motor flexível em nosso País saltou, num período de dois anos, de uma participação de cerca de 3% para mais de 60% no mercado de veículos novos e todos os prognósticos apontam para uma participação de cerca de 86% no mercado até o final de 2006. Entre as grandes montadoras, a Toyota e a Honda também já anunciaram que vão entrar neste mercado, o que confirma a expectativa de que, dentro em breve, 100% da nossa frota de carros de passeio serão dotados desta tecnologia.

O que isso enseja? Um formidável avanço do setor sucroalcooleiro diante da possibilidade de expansão da produção de álcool. Porém, essa expansão virá em volume suficiente? Que planejamento está sendo obedecido? Como cotejar essa necessidade de incremento da produção de álcool, diante da valorização de 168%, nos últimos dois anos, da cotação do açúcar na Bolsa de Nova York? Na safra passada, a lavoura canavieira foi destinada, majoritariamente, para a produção de álcool, mas isso se manterá? A mistura de 25% de anidro na gasolina deve ser mantida, ou reduzida para garantir o abastecimento, mesmo que acarrete aumento no preço na bomba ao consumidor?

Essas perguntas precisam ser respondidas. Não há como administrar pensando nos próximos meses. Faço o apelo para que o governo estabeleça um fórum permanente de discussão estratégica, não simplesmente em meio a crises anunciar impulsos intervencionistas que não resolverão o problema. Já o setor sucroalcooleiro precisa se auto-regular para disciplinar o seu crescimento, planificar a sua expansão e planejar a disponibilidade deste combustível ao longo da safra. Isso precisa ser feito de uma forma minimamente acordada com as montadoras, para que o consumidor tenha plena informação, segurança e confiabilidade para fazer sua escolha.

O Poder Público, por meio do Executivo e do Legislativo, e toda a cadeia produtiva do setor precisam compartir responsabilidades não apenas para enfrentar aspectos circunstanciais, mas pleitear uma discussão estratégica de longo prazo. Cabe aqui destacar a iniciativa da ANP (Agência Nacional de Petróleo e Gás) de introduzir o corante no álcool anidro para moralizar este mercado, iniciativa que merece o nosso apoio, mas foi um ingrediente a mais para conturbar os preços no período de entressafra.

O nosso País pode ter uma oportunidade de ouro, com a consolidação do mercado interno e a possibilidade do álcool se tornar um importante componente da nossa pauta de exportação, não só o produto em si, mas o maquinário e o know how que adquirimos ao longo dos últimos 30 anos. Mas, tudo isso estará comprometido caso a "CREDIBILIDADE SEJA ABALADA". Credibilidade esta que só continuará respaldada com o nosso entusiasmo por estas fontes energéticas não poluentes e renováveis, pelo orgulho que temos de sistematicamente batermos recordes de produtividade neste segmento, mas, acima de tudo, se pudermos fixar um planejamento estratégico para este combustível verde-amarelo que pode ganhar o mundo.



Deputado Arnaldo Jardim* é Coordenador da Frente Parlamentar pela Energia Limpa e Renovável

arnaldojardim@arnaldojardim.com.br

www.arnaldojardim.com.br

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