Um certo padre

Opinião
27/09/2005 16:40

Compartilhar:

Milton Flávio<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/03-2008/MiltonFlavio7.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a>

Costumo ser duro em meus comentários. Defendo com veemência meus pontos de vista. Pago o preço. Desde sempre, isto me causou alguns dissabores na Assembléia Legislativa. Não me arrependo. Alguns parlamentares, mais experientes, sempre me criticaram por eu dizer o que penso. Aqui e acolá, devo ter exagerado. Não nego. Mas minha veemência é tolerante. O que não tolero é a hipocrisia. Não transijo com os cínicos, sejam eles padres ou não. Não tolero gente que busca na batina salvo conduto para seus desatinos. Um figurino que cai à perfeição ao senhor Lanccelotti, o tal do padre Júlio, do "povo de rua".

Este senhor, há anos, faz dos púlpitos que ocupa uma tribuna livre, para divulgar suas teses perturbadas. Agora mesmo, vem a público para criticar a administração José Serra (PSDB) porque ela resolveu fechar uns vãos na passagem que liga a avenida Paulista à avenida Dr. Arnaldo, com o objetivo de diminuir a incidência de assaltos e outros delitos.

Alguns miseráveis faziam do local seu lar improvisado " e outros, seu esconderijo possível. Na visão do religioso, dublê de padre de passeata e militante de carteirinha do PT, o que está em curso é uma política higienista, de perseguição aos pobres, de eliminação dos miseráveis. Sua tolice é aparente. O homem tem método. É capaz de ir muito longe. Sua fé é fé de fancaria.

Padre Júlio é, com perdão da comparação vulgar, galinha de poucos ovos e muito cacarejo. Não lhe interessa contribuir com idéias para eliminar ou diminuir a miséria. Pela simples e definitiva razão de que ela, a miséria alheia, é sua razão de viver, seu ganha-pão. Aos seus amigos de fé e credo político, um pedido: não percam tempo comigo. Enviem cartas e e-mails aos seus, não a mim. E desde já lhes agradeço pela ira que me dedicam. Que o bom padre os tenha!

A questão é simples. A vida de quem mora nas ruas é a pior possível. O problema é que a esmagadora maioria dos indigentes não quer ir para os albergues. E sabem por quê? Porque os albergues, certamente, não são grande coisa. Mas, sobretudo, porque nos albergues não se pode beber nem usar drogas. É uma gente sofrida, sem perspectiva. É uma gente que não se vai libertar com a retórica equivocada e oportunista do padre Júlio. O homem não tem " e nunca teve " interesse em consertar nada. O fato de ser padre não diminui o tamanho de seus equívocos. Muito pelo contrário.

O que mais me chama a atenção na sua falação irresponsável é o fato de que o padre jamais levantou sua voz estridente contra seus companheiros de batina. E muitos deles, há tempos, não fazem outra coisa a não ser pôr grades ao redor das igrejas sob sua responsabilidade. E sabem para quê? Para impedir que os mendigos, o tal "povo de rua", façam acampamento em suas portas. Estão errados os padres? Só o Júlio está certo? Que discurso é este, que só leva em conta o que lhe interessa e nenhum benefício traz aos pobres?

*Milton Flávio é professor de Urologia da UNESP, deputado estadual pelo PSDB e vice-líder do governo na Assembléia Legislativa de São Paulo

www.miltonflavio.org

miltonflavio@al.sp.gov.br

alesp