Assembleia promove evento para marcar dez anos da Lei Maria da Penha
12/08/2016 17:46 | Da redação - Fotos: Vera Massaro




O empoderamento feminino e a recuperação do agressor como fatores de prevenção à violência foi um dos principais pontos de discussão da audiência pública "10 anos da Lei Maria da Penha e a rede de atendimento às mulheres vítimas de violência doméstica". O evento foi promovido pela deputada Márcia Lia (PT) em 9/8, na Assembleia Legislativa, com objetivo de contribuir para a efetiva e completa aplicação da legislação.
Márcia Lia abriu o debate apresentando dados de violência contra a mulher, entre eles que 56% dos homens admitem já ter cometido alguma forma de agressão física ou psicológica contra uma companheira e que 38% das mulheres em situação de violência sofrem agressões diariamente. "Esses dados mostram que a violência acontece no seio da família, nas relações de afetividade e, na maioria das vezes, acomete as mulheres. Precisamos reforçar tudo aquilo que a lei pode fornecer e melhorar as condições para diminuir a violência contra as mulheres", disse a deputada.
As melhorias na rede de atendimento à mulher vítima de violência foram tratadas pelo secretário estadual de Justiça e Defesa da Cidadania, Márcio Elias Rosa. Ele admitiu falhas no sistema atual e também demonstrou preocupação com o agressor. "Ele é o réu, mas não perde a dignidade da pessoa humana e precisa ser tratado como tal. Hoje, o sistema precisa oferecer a ele uma reinserção na sociedade", afirmou.
Sistema único de proteção e acolhimento
O secretário lembrou que a Constituição Federal contempla a criação de sistemas únicos, mas a questão da segurança nacional nunca foi tratada como essa proposta. Ele acredita, no entanto, que o mais importante para este momento é pensar na rede de atendimento unificada, com saúde, assistência social, habitação e segurança pública "para que o Estado seja capaz de recepcionar a vítima, ter credibilidade junto a ela, não fazer dela vítima de novo, e para que ainda possa acolher o agressor. Não podemos fracionar a política pública em uma área tão sensível, temos de aprender a trabalhar no sistema integrado e depois criar um sistema único", afirma.
Atualmente, a cidade de São Paulo tem dois projetos experimentais em que a Guarda Civil Metropolitana e agentes de saúde contribuem para a aplicação da Lei Maria da Penha, segundo o secretário. No projeto Guardiã, a GCM faz a fiscalização das medidas protetivas e vai às residências das vítimas. Já em Cidade Tiradentes, integrantes do Programa Saúde da Família e lideranças comunitárias foram capacitados para divulgar a Lei Maria da Penha nas casas. "É um exemplo de integração, pois se trata de um programa federal em que a autoridade que capacita é estadual e o resultado se dá em âmbito municipal".
Com a proposta de integrar o atendimento às vítimas e devolver a elas a autoestima para a retomada de suas atividades, a Coordenadoria da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar do Poder Judiciário do Estado de São Paulo (Comesp) tem trabalhado há três anos com os conselhos, Ordem dos Advogados do Brasil, Ministério Público e as entidades Geledés Instituto da Mulher Negra e Instituto Artemis. Recentemente, ainda desenvolveu o Projeto Fênix, que dá à vítima de violência prioridade no atendimento médico reparatório, físico e estético, por indicação do juiz, e fez parceria com a ONG Turma do Bem para oferecer atendimento de reparação odontológica para quem teve danos em razão de socos e outros golpes de violência doméstica.
Atendimento é prioridade
A sensibilização das pessoas que trabalham nas "portas de entrada" do atendimento às vítimas de violência doméstica " delegacias e unidades de saúde ", para que as mulheres sintam-se acolhidas e deem continuidade ao caso na rede, foi o tema abordado pela presidente do Conselho Estadual da Condição Feminina, Rosmary Corrêa. "Não dá para pedir à vítima voltar depois. É preciso atender, mesmo que demore horas", afirmou. A delegada ressaltou ainda a importância de capacitar policiais, médicos, enfermeiros para que eles conheçam o que a rede tem na região e encaminhem a vítima para outros atendimentos.
Ela também defende mudanças na descrição das lesões colocadas nos laudos do Instituto Médico Legal (IML). A maioria apontará, segundo a delegada, lesão leve, porque lesão grave só se configura quando a mulher estiver impedida de trabalhar por 30 dias. "Ela pode estar toda machucada, mas se puder trabalhar, ao final o legista vai colocar lesão leve. Quando o juiz recebe o laudo, ele não está vendo a vítima e vai considerar apenas o que está no laudo. Estamos pedindo aos legistas para fotografar e explicitar no laudo todas as lesões que a vítima tem para dar uma visão melhor do que a mulher sofreu", considera.
A defensora pública Yasmin Oliveira Mercadante Pestana, do Núcleo Especializado de Promoção e Defesa dos Direitos da Mulher da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, lembrou que o papel do Estado vai além da punição do agressor. A Defensoria tem o papel de dar voz à mulher e atendê-la do ponto de vista integral, de forma a respeitar sua autonomia. "É um crime, sim, mas muitas delas não querem a punição, não querem o boletim de ocorrência; elas querem o divórcio, a guarda dos filhos, a medida protetiva. E por isso a Defensoria tem defendido que a medida protetiva não necessite do boletim de ocorrência, até porque a Lei Maria da Penha não prevê esse vínculo. É preciso desburocratizar."
Na visão da ativista Sônia Coelho, representante da Sempreviva Organização Feminista, a diminuição dos casos de violência contra mulheres começa com ações preventivas que, obrigatoriamente, passam pelo empoderamento feminino. "A auto-organização das mulheres é o maior aspecto para lutar contra a violência, para que haja mudança na sociedade, para que se interfira na violência. A raiz da violência da mulher é a desigualdade na sociedade, é a opressão que nós vivemos, é o uso da violência como mecanismo de controle do nosso corpo, da nossa vida, da nossa autoridade", avalia a especialista.
Nos trabalhos desenvolvidos pela Sempreviva, Sonia diz ter verificado o crescimento da violência contra as mulheres mais jovens e as negras, especialmente nos espaços públicos. "A Lei Maria da Penha contribuiu para a sociedade fazer a discussão da desnaturalização da violência, isso é fundamental nessa luta, mas ela sozinha não dá conta de enfrentar essa sociedade patriarcal, racista e machista. A gente quer que a violência não aconteça, mas se acontecer precisa haver meios e equipamentos para a mulher ser apoiada, acolhida".
Patrimônio do homem
A procuradora Ana Paula Zomer, que representou a Comissão da Mulher Advogada da OAB-SP, reforçou a necessidade da "luta incansável" pelo empoderamento das mulheres para evitar a incidência de casos de violência. "A primeira razão de ser da violência de gênero é o fato de se vislumbrar na mulher um objeto, uma determinada posse que permita ao futuro agressor dispor dela como lhe aprouver, até a hora em que ela não se permitir mais fazer parte do patrimônio do agressor. E quando ela não se permite mais fazer parte do patrimônio do agressor, ela é agredida", avalia.
Com seu olhar de criminóloga, a procuradora busca entender os porquês da violência e por qual motivo ela acontece no seio da família. A conclusão é que a construção da imagem da mulher que serve e tem a única função de assessorar o outro é feita dentro de casa, quando a menina só brinca com bonecas e panelinhas e quando é ela quem substitui a mãe nas funções de cuidado com a casa, nunca o irmão. "Facilmente ela se transforma em objeto. É isso que está na visão da sociedade, como ela enxerga o que a mulher é capaz de fazer e sua efetiva habilidade em definir os seus destinos", fala.
A desembargadora Angélica de Maria Mello de Almeida, coordenadora da Coordenadoria da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar do Poder Judiciário (Comesp), tratou dos casos de violência já consumados e constatou a preferência do agressor pelo rosto da vítima. Segundo ela, é uma maneira de atingir ainda mais a dignidade da pessoa humana, porque significa desnaturar a mulher. São casos de cortes com navalha, ácido e substâncias inflamáveis, sempre com lesões muito graves provocadas por ex-namorados e ex-companheiros.
Em um dos casos relatados pela desembargadora, o agressor encontrou a ex-namorada com um novo relacionamento e riscou o rosto dela com navalha. Em outra situação, outro rapaz inconformado com o fim do namoro por iniciativa da mulher mordeu o nariz dela e arrancou um pedaço. "São casos de uma gravidade intensa e, dentro deste contexto, a mulher se sente constrangida em dizer à sociedade que sofre violência dentro da sua casa, que sua casa não é um lugar onde ela tem condição de segurança. Outras vezes, tem medo porque, uma vez levada ao delegado, a agressão pode se tornar mais constante e grave", avalia.
Para a ex-deputada Telma de Souza, a violência nasce da repetição e a agressão sofrida por uma mulher é repassada por ela aos filhos, de forma que essa força continua a atingir as relações, familiares ou não. "Uma sociedade é constituída de maneira democrática ou de maneira violenta. Meu pai foi cassado na ditadura militar, ficamos em casa presos com o Exército na nossa porta, eu, meu pai e minha mãe. Era uma violência que a sociedade daquela época começou a repetir. E, enquanto não tivermos a compreensão do que nos acontece, das relações que uma sociedade constrói para nos libertarmos ou não, não conseguiremos ter cidadania plena para sermos protagonistas das nossas vidas", aponta.
Violência institucional
A violência institucional foi o tema abordado por Isabela Cunha, do Projeto Estrangeiras, realizado pelo Instituto Terra, Trabalho e Cidadania (ITTC), com mulheres estrangeiras encarceradas no Brasil.
Ela explica que o sistema prisional brasileiro foi feito por e para homens e não contempla as especificações de gênero. Diante do "boom" de prisões de mulheres nos últimos anos " de 2006 a 2012, as prisões de mulheres aumentaram 246%, contra 130% de homens ", a maioria por tráfico de drogas, o sistema se tornou outra ferramenta de violação dos direitos das mulheres.
Na prisão, a mulher faz atividades de costura, faxina e nunca tem capacitação para conseguir uma colocação melhor no mercado de trabalho quando sair do cárcere. Também não recebe atendimento regular no sistema de saúde para fazer mamografias e Papanicolau. E não pode ficar com os filhos recém-nascidos por mais de seis meses, na melhor das situações. Em muitos casos, as crianças são colocadas para adoção, desconsiderando-se que esta mulher um dia irá sair da prisão. "São Paulo é o Estado que mais prende pessoas e o que mais prende mulheres em todo o país, mas não está preparado para lidar com elas. São mães, de baixa escolaridade, principais provedoras do lar, e talvez essa rede precise pensar também nessas mulheres e nos familiares delas."
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