Obelisco: marco da resistência paulista em defesa da democracia no passado, presente e futuro

Monumento levantado no Parque Ibirapuera é mausoléu dos heróis combatentes da Revolução de 1932 e também símbolo dos ideais de liberdade do povo paulista
05/07/2023 19:07 | Especial 9 de Julho | Fábio Gallacci - Fotos: Rodrigo Romeo

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Obelisco - Heróis de 32<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-07-2023/fg304902.jpeg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Obelisco - Heróis de 32<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-07-2023/fg304903.jpeg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Obelisco - Heróis de 32<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-07-2023/fg304904.jpeg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Obelisco - Heróis de 32<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-07-2023/fg304905.jpeg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a>

No gramado circular, uma gigantesca espada se levanta para lembrar eternamente a maior vitória política de São Paulo. A simbologia em torno do Obelisco, monumento-mausoléu no Parque Ibirapuera, onde descansam os heróis da Revolução Constitucionalista de 1932, encanta gerações, abriga muita história, controvérsias e detalhes que merecem uma visita até a Capital.

"O Obelisco é um dos maiores símbolos da história paulista do século 20. Ele tem parte importante na construção da identidade paulista, daquilo que hoje chamamos de paulistanidade", afirma Francisco Quartim de Moraes, doutor em História pela USP, autor do livro "1932: A história Invertida" e neto de um combatente civil - lotado no batalhão Borba Gato.

Com 72 metros de altura, a estrutura de mármore travertino projetada pelo escultor ítalo-brasileiro Galileo Ugo Emendabilli e construída pelo engenheiro alemão Ulrich Edler começou a ser levantada em 1947 para ser o marco da revolução que os paulistas perderam no campo de batalha, mas que teria provocado a promulgação de uma nova Constituição Nacional dois anos depois.

Embora tenha sido inaugurado em 9 de julho de 1955, com a abertura do Parque do Ibirapuera e do lançamento do Monumento às Bandeiras, a finalização da obra se deu apenas no ano de 1970. Seu interior guarda os restos mortais dos jovens Mário Martins de Almeida, Euclides Bueno Miragaia, Dráusio Marcondes de Sousa e Antônio Americo de Camargo Andrade, mortos no dia 23 de maio de 1932 durante uma manifestação popular contra o governo do então presidente Getúlio Vargas.

"Morreram jovens para viver para sempre"

Na época, em homenagem a eles, foi criado um movimento contra o poder federal, denominado MMDC, com as iniciais de cada um dos quatro jovens mortos. Esse grupo oferecia preparação militar para outros voluntários que desejassem "lutar pela democracia em São Paulo" na década de 1930. Atualmente, no Obelisco, junto aos heróis tombados, estão os restos mortais de outros 713 combatentes do movimento.

Os quatro lados do monumento-mausoléu estão voltados para os pontos cardeais e suas paredes apresentam esculturas e altos-relevos com a história de São Paulo. No interior, mosaicos feitos com pastilhas representam cenas bíblicas e passagens históricas brasileiras. No local, ainda há uma cripta em forma de cruz grega sustentada por arcos que lembram as tradicionais arcadas da Faculdade de Direto do Largo São Francisco, berço do Movimento de 32.

Soldado desconhecido

No centro da estrutura, uma estátua em mármore do Soldado Desconhecido descansa sobre um bloco de mármore maciço, com os nomes inscritos dos quatro primeiros caídos pela Revolução. Embaixo deste bloco está uma bandeira paulista, onde estão os restos mortais dos heróis revolucionários. A figura do soldado está no centro da base do Obelisco. Duas portas de bronze, uma voltada para a Avenida 23 de Maio - data em que os quatro jovens MMDC foram mortos -, e outra para o Ibirapuera completam o ambiente recheado de significados especiais.

Plataforma de contestação

"O Obelisco é um marco visual do compromisso das elites dirigentes de São Paulo, e também de grande parte da sociedade, com o processo de constitucionalidade do País. Ou seja, ele também era um lembrete do peso político dos paulistas e um contraponto às pretensões de Getúlio Vargas de se perpetuar no poder", lembra Paulo César Garcez Marins, professor e doutor em História pela USP. "O que nós tínhamos em 1932 era uma ditadura, um regime de exceção. Portanto, não à toa que em 1982, quando chegamos aos 50 anos da Revolução, o então governador Franco Montoro celebrou muito esse mesmo monumento. Os dois altares laterais, que estão dentro da cripta, não existiam no projeto original e foram feitos em 1982. Num dos dizeres desses altares está plenamente grafado o compromisso com a democracia, o que era certamente uma vontade das elites do então MDB paulista de se oporem mais uma vez a uma ditadura, nesse caso a Ditadura Militar de 1964, que ainda vigorava. O Obelisco, mais uma vez, servia como plataforma de contestação de uma ditadura", acrescenta Marins.

Patrimônio e místico

Atualmente, a obra é patrimônio histórico e cultural, tombado pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico (CONDEPHAT). Uma curiosidade é perceber que o número 9 aparece em vários aspectos do projeto: há nove degraus que conduzem à cripta; a altura do Obelisco, da base até o topo do monumento é de 72 metros (7 somado a 2 resulta em 9); já a distância da cripta ao topo é de 81 metros, cuja soma dos algarismos também dá nove. Se ainda fizermos a soma aritmética desses valores (72 e 81) teremos 7+2+8+1= 18 (1+8 = 9).

Galileo Emendabilli, mentor do Obelisco, nasceu em Ancona, na Itália, em 1898. Aos 25 anos, escolheu o Brasil como sua segunda pátria e se integrou a vários movimentos artísticos locais. Já com diversos projetos executados, o escultor concorreu, em 1934, com duas maquetes no concurso público para a criação do Monumento - Mausoléu aos Heróis da Revolução Constitucionalista de 1932. "Testemunhei, como filha, o labor incansável, a paixão com que Galileo se entregou de corpo e alma à tarefa de construir o importante monumento paulista", conta Fiammetta Emendabilli, em entrevista dada ao portal da Alesp, em 2003.

Olhar contemporâneo

Tanto o professor Paulo César Garcez Marins quanto Francisco Quartim de Moraes abordam os conceitos que fizeram do Obelisco do Ibirapuera uma obra colossal de importância histórica e política para o DNA paulista, mas não deixam de lado o papel fundamental dos historiadores: o de manter a chama viva do questionamento.

"É importante que a gente sempre coloque os monumentos em discussão. O Obelisco tem, hoje, características em sua ornamentação bastante complicadas. Há, por exemplo, um dos relevos que coloca um homem indígena ajoelhado diante de um bandeirante paulista. O que era admissível nas décadas passadas, atualmente, suscita muitas críticas. Por isso, sempre é importante estabelecer um debate sobre essas imagens", opina Marins. "Outra questão é essa ideia de um protagonismo paulista. Hoje, percebemos que os destinos da nação são construídos a partir de uma perspectiva muito mais equilibrada e alargada", complementa o professor.

Outro lado da história

Já Francisco Moraes questiona o discurso oficial sobre a Revolução de 32 e a consequente construção do Obelisco. "Acho que o Obelisco é mais uma peça de propaganda dos que defendem a 'vitória moral' paulista, apesar da derrota militar. Mas, como historiador, preciso ressaltar que o levante começado em 9 de julho não obteve conquistas práticas e não foi uma vitória, nem militar e nem política de São Paulo" explica, destacando que, apesar de todo o movimento registrado oficialmente, já havia uma organização prévia da Constituição ainda antes da data.

Dessa forma, de acordo com o pesquisador, a revolução tem traços políticos e ideológicos que precisam ficar registrados na história. "Os motivos para o movimento de São Paulo vão bem além da vontade de ?reconstitucionalizar? o País, mas passam por disputas políticas e econômicas advindas da tomada de poder feita pelo grupo reunido em torno de Getúlio Vargas no ano de 1930. Dentre os grupos que apoiaram Vargas, estava o Partido Democrático de São Paulo, organização que ao longo do ano de 1931 rompeu com o Governo Provisório e passou a organizar o movimento paulista", explica Moraes.

Visita

Com tantos detalhes a serem explorados, quem quiser vivenciar de perto a experiência de conhecer um ícone da arquitetura e da história paulista pode fazer uma visita, que é grátis. O Obelisco Mausoléu aos Heróis de 32 está localizado na Praça Ibrahim Nobre, s/nº - Vila Mariana, em São Paulo (próximo ao portão 3 do Parque Ibirapuera). A visitação está aberta de segunda-feira a domingo, das 10h às 16h.

alesp