Audiência pública defende permanência de SP no Programa Nacional do Livro Didático

As matérias da seção Atividade Parlamentar são de inteira responsabilidade dos parlamentares e de suas assessorias de imprensa. São devidamente assinadas e não refletem, necessariamente, a opinião institucional da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo
09/08/2023 12:04 | Atividade Parlamentar | Da Assessoria do deputado Carlos Giannazi

Compartilhar:

Giannazi preside audiência em defesa do PNLD<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-08-2023/fg306544.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a>

Primeiro, veio o anúncio de que não haveria mais livros didáticos, todo o conteúdo seria acessado apenas por meio digital. Depois, foi dito que alunos e professores poderiam imprimir o material, se desejassem, utilizando os equipamentos das escolas (como se houvesse estrutura para isso!). Por fim, o governador informou que o material encadernado seria distribuído a todos os alunos. "A cada recuo do governo, a situação fica pior, porque ele não consegue justificar suas decisões. Se for confirmada a intenção de o Estado imprimir seu próprio material didático, nós vamos entrar com uma ação popular no Tribunal de Justiça acusando o governador do crime de improbidade administrativa", afirmou Carlos Giannazi (PSOL), durante audiência pública realizada na segunda-feira, 7/8, na Assembleia Legislativa.

"Se nós já temos o material todo pronto, conceituado e reconhecido em todo o Brasil, sendo custeado pelo governo federal, não há motivo nenhum para que São Paulo não entre no Programa Nacional do Livro e do Material Didático (PNLD). A não ser que haja interesse econômico ou ideológico, ou os dois ao mesmo tempo", disse o deputado, que é membro titular da Comissão de Educação. Ele ponderou que escolas particulares de ponta, como Bandeirantes, Gracinha e Cervantes, utilizam materiais incluídos na lista do PNLD. Por outro lado, o fato de o secretário da Educação ser proprietário da empresa que fornece os equipamentos eletrônicos para a rede estadual não contribui para dar credibilidade às suas boas intenções.

Contramão

Para Ana Cláudia Martins, do Conselho Regional de Biblioteconomia (CRB - 8ª Região), o que houve foi uma falta de respeito absurda com a população de São Paulo. "Ele não pode chegar aqui, dizer que não quer mais aderir ao PNDL e impor um livro digital. Uma atitude como essa teria de ser analisada, conversada, debatida?" A bibliotecária também ressaltou que, segundo a Unesco, há poucas evidências do valor agregado de tecnologia digital na educação, tanto que os países que tentaram digitalizar 100% o processo educacional decidiram voltar atrás. Um exemplo é a Suécia, que há 15 anos substituiu os cadernos dos alunos por tablets, mas decidiu voltar ao material didático tradicional depois de constatar uma consistente queda nas competências de expressão e leitura de seus alunos. Também aumentou a dependência da informação pronta, e a vontade de investigar diminuiu.

Ainda que a Secretaria da Educação pretendesse apresentar uma alternativa comparável em qualidade ao PNLD - um programa que vem sendo desenvolvido e aprimorado pelo governo federal desde 1937 -, não teria expertise para tanto. Foi isso que Ângelo Xavier, da Associação Brasileira de Editores e Produtores de Conteúdo e Tecnologia Educacional (Abrelivros), deixou claro ao explicar como funciona o processo de seleção das obras.

Depois de escritos e editados conforme as premissas descritas em edital, os livros são descaracterizados, ficando impossível reconhecer seus autores, bem como a casa editorial. Só então são submetidos a uma equipe de avaliadores, cujos nomes permanecem em sigilo durante todo o processo. Os livros aprovados passam a compor um guia, a partir do qual todas as escolas do Brasil podem escolher o material que utilizarão com seus alunos. "Neste PNLD existem 91 obras em sete disciplinas", informou Xavier, ressaltando que todos os livros do programa são acompanhados de recursos digitais de alta qualidade.

Bibliodiversidade

Professor da rede estadual e dirigente do Centro do Professorado Paulista (CPP) de Guarulhos, Márcio José Martire criticou a falta de diálogo com os docentes em relação à imposição do conteúdo digital. Ele considera que o momento é o pior possível, já que os alunos vêm de um período de pandemia no qual ficaram dois anos afastados da escola. "É como se os alunos tivessem dormido no terceiro ano e acordado no sexto, sem maturidade. Eles mal aprenderam a escrever no papel e já vão ter de escrever em meios digitais. Esse impacto será sentido no futuro", alertou, sem descartar a possibilidade de haver motivação ideológica em um material único, o que pode também ser considerado como violação à liberdade de cátedra.

Maria Cecília Condeixa, da Associação Brasileira de Autores de Livros Educativos (Abrale), considera que os livros do PNLD representam a pluralidade de ideias e de concepções pedagógicas, preconizadas desde a elaboração da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB). "Seria um absurdo não oferecer ao professor e aos alunos a possibilidade de trabalhar com o livro físico, que é rico de ideias, que é diversificado, que é bonito!", disse. Além disso, ela ponderou a importância da possibilidade de escolha, que permite a cada escola optar pelo material que melhor dialoga com a sua realidade imediata.

Rosaura Almeida, presidente do Sindicato dos Supervisores de Ensino (Apase) entende o PNLD como equiparação de oportunidades no acesso ao currículo, ou, ao menos, uma diminuição das desigualdades. Fazendo uma comparação à área da saúde, na qual a Lei do Ato Médico restringe certas intervenções aos profissionais habilitados, Rosaura defende o respeito ao Ato Pedagógico, que é realizado pelo professor exercendo sua liberdade de cátedra. "Quando um professor organiza a sua aula, isso não pode ser feito de uma forma única. Turmas são diferentes, estudantes são diferentes, requerem uma diversidade de possibilidades para que possam aprender." A sindicalista ainda deslegitimou a autoridade do governo estadual em recusar livros didáticos para seus estudantes, uma vez que pertence a eles esse direito. "Onde está o Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente", questionou.

Encaminhamentos

Algumas providências tomadas por Giannazi já começaram a dar resultado. É o caso da representação apresentada ao Ministério Público, que resultou na instauração de inquérito civil. Segundo a advogada Beatriz Blanco, essa investigação é o meio adequado para que se investigue a posição de conflito de interesses em que se encontra Renato Feder, ao fornecer equipamentos eletrônicos para a secretaria que comanda.

No Tribunal de Contas do Estado, o Poder Executivo terá de explicar por que estaria abrindo mão de um recurso federal equivalente a R$ 200 milhões, sendo que o gasto com material digital e sua versão encadernada sequer foi estimado.

Por fim a representação no Núcleo de Infância e Juventude da Defensoria Pública também foi acatada, ensejando a instauração de apuração preliminar, com prazo de dez dias para que o governo esclareça uma série de questões.

Presentes na audiência pública, a deputada federal Luciene Cavalcante (PSOL-SP) se comprometeu a acionar nesta semana o Tribunal de Contas da União; e o vereador paulistano Celso Giannazi (PSOL) vai propor uma moção de repúdio contra a saída de São Paulo do PNLD, medida que deve ser replicada em outros Legislativos municipais.

Em princípio, o prazo para que o Estado apresente a lista com a quantidade de cada livro requisitado se encerraria na segunda semana de agosto, entretanto, Carlos Giannazi acredita que o MEC vai flexibilizar essa data. "É o Estado de São Paulo. A partir do momento em que o governo decida voltar ao programa, tenho certeza de que o MEC não vai colocar nenhuma objeção", concluiu.


alesp