Dia do Orgulho Trans: audiência na Alesp debate acesso a procedimentos de transição de gênero
16/05/2025 19:00 | Saúde | João Pedro Barreto - Fotos: Larissa Navarro





A Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo sediou, na noite da última quinta-feira (15), uma audiência pública que debateu o acesso a procedimentos de transição de gênero para a população trans paulista e brasileira. Solicitado pela deputada Monica Seixas do Movimento Pretas (Psol), o evento foi motivado por uma resolução do Conselho Federal de Medicina que restringe acesso a terapias hormonais e bloqueio de puberdade, publicada no início do mês de abril. O encontro marcou o Dia do Orgulho Trans e Travesti, celebrado em 15 de maio.
"A resolução do Conselho Federal de Medicina choca por dois atravessamentos. O primeiro e o mais dramático é o atravessamento ao direito à saúde da população trans. A gente não está falando só de uma identidade, mas como o desenvolver dessa identidade não vai provocar mortes, ainda que sejam mortes em vidas, com processos depressivos. Ouvimos histórias de amputações por conta de mulheres trans que injetam silicone industrial, por não terem acesso à saúde digna e atendimento digno na sua transição", explicou Monica Seixas.
"Estamos falando também de um atravessamento à categoria médica. A liberdade entre médico e paciente não é permitida pelo CFM quando ameaça médicos que cumprem o julgamento que fizeram ao se formar na faculdade de atender com dignidade a todos e todas em sua saúde", completou a deputada.
Como a resolução atinge a classe médica e a saúde de todo o país, o objetivo do encontro, segundo Monica, também foi ampliar a articulação com a esfera federal para pressionar pela mudança. "A gente sai daqui com uma escuta ativa da comunidade, dos médicos, dos familiares, mas é imperativo que o Governo Federal se envolva. Afinal, é o Ministério da Saúde que vai determinar quem acessa ou não a saúde e como. É preciso que ele se pronuncie para garantir a liberdade de trabalho dos médicos e o acesso à saúde da população trans." A audiência foi realizada em parceria com a deputada federal Sâmia Bomfim (Psol-SP).
Pluralidade
"Ser trans é só mais uma questão da pluralidade humana. Por que crianças não podem fazer parte dessa diversidade? Crianças são sujeitos de direitos, sabem identificar o corpo que têm. Elas sabem que tipo de vestimenta querem usar, o tipo de cabelo que querem e que papel querem desempenhar na sociedade. Crianças são sujeitos de direitos, não podemos tirar as crianças dessa condição", defendeu a diretora da ONG Minha Criança Trans, Claudia Armbrust.
O médico endocrinologista formado pela USP (Universidade de São Paulo) e especialista no atendimento à população trans, Júlio Américo Batatinha, pontuou que a medicina não tem certezas, mas que sempre busca as melhores evidências para basear as decisões. Segundo ele, os estudos apontam que não há malefícios no uso do bloqueio puberal e de terapias hormonais na idade que era recomendada até então pelo CFM.
Até a última resolução, classificada pelo médico como um retrocesso, crianças poderiam realizar o bloqueio hormonal já no início da puberdade. Terapias hormonais cruzadas eram permitidas a partir dos 16 anos. Agora, ambos os procedimentos só podem ser feitos a partir dos 18 anos. Cirurgias de transição com efeito esterilizador, antes feitas a partir dos 18, agora só são permitidas após os 21 anos.
"Sabemos desde a década de 1970 que identidade de gênero é algo que surge muito cedo. A partir dos 2 anos de idade, a criança já começa a ter ideia da sua identidade, então a criança tem idade suficiente para saber se é trans. O meu papel como médico não é dar diagnóstico, falar quem é ou não trans, porque identidade de gênero não é um diagnóstico. O nosso papel é garantir que essa pessoa tenha os instrumentos para tomar as melhores decisões e identificar sofrimentos", argumentou o especialista, que apresentou estudos que apontam que 75% das crianças trans já fizeram automutilação e que essa população possui uma chance cinco vezes maior de ideação suicida.
Claudia, que é mãe de uma menina trans, ainda contou que a resolução do CFM preocupou toda a comunidade envolvida e argumentou que o texto se "camufla de cuidado, mas, na realidade, tira direitos". "As crianças e adolescentes que não se identificam com o gênero de nascimento têm inúmeras questões de disforia com o próprio corpo. Elas fazem o bloqueio puberal para impedir que o corpo desenvolva a puberdade no caminho que elas não desejam e lidam ainda com a ansiedade e com os apontamentos da sociedade. Agora, o CFM está impedindo essas crianças de terem certos alívios e elas vão ter que lidar com isso de forma psiquiátrica, talvez medicamentosa, ou vão para informalidade, para clandestinidade", comentou.
"Não é possível fazer de conta que pessoas trans só nascem aos 18 anos. Existe uma infância e uma adolescência. Sem este bloqueio puberal, elas vão sofrer todas as mudanças continuamente, vão ver o seu corpo mudar até os 18 anos?", questiona a mãe.
Crivo diferente
Os presentes ainda questionaram o fato da resolução restringir apenas esses procedimentos voltados à população trans. Terapias hormonais e o bloqueio puberal ainda é permitido a crianças e adolescentes cisgênero. Júlio Batatinha citou casos como garotas que tomam anticoncepcional ainda muito jovens e garotos que operam por conta de ginecomastia.
"Para essas cirurgias de modificação corporal e para esses hormônios que são usados, ninguém questiona se eles seriam jovens demais para entender sobre sua própria identidade. E felizmente não se questiona porque é evidente o grau de sofrimento quando tem uma característica no seu corpo que não condiz com a identidade de gênero. Por que com as crianças e adolescentes trans o crivo é diferente se o cérebro e o funcionamento do corpo é o mesmo?", perguntou o endocrinologista.
Segundo o CFM, a Resolução 2.427/2025 foi aprovada no plenário do órgão, que está "preocupado em colaborar com a melhoria da assistência em saúde às pessoas com incongruência de gênero".
O conselheiro federal Raphael Câmara, relator do texto, argumentou que o bloqueio puberal vem sendo debatido ao redor do mundo. "Especialistas destacam a necessidade de mais estudos de longo prazo para entender completamente os efeitos dos bloqueadores de puberdade, tanto físicos quanto psicológicos. A evidência atual é limitada e muitas vezes baseada em estudos de curto prazo. Como a prática mostrou que não são inócuos ou facilmente reversíveis, está havendo regressão na recomendação de seu uso", pontuou Câmara, que não esteve presente no evento.
Assista à audiência pública, na íntegra, em transmissão pela Rede Alesp:
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