Maio Amarelo: transporte público de qualidade é estratégia que reduz mortalidade, diz especialista

Relatório divulgado pelo Ipea indica que 392 mil pessoas morreram em sinistros de trânsito entre 2010 e 2019 no Brasil, um aumento de 13,5% em comparação com a década anterior; crescimento de mortes envolvendo motocicletas aponta necessidade de políticas públicas direcionadas
26/05/2025 17:27 | Segurança no trânsito | Gabriel Eid - Fotos: Agência Senado e Rodrigo Romeo

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veículos de diferentes modais ocupam São Paulo<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-05-2025/fg345719.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Daniel Freitas: insegurança alta<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-05-2025/fg345712.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Acidentes com moto, crescem atropelamentos caem<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-05-2025/fg345714.png' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Acidentes totais continuam crescendo<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-05-2025/fg345715.png' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a>

Em maio de 2011, uma resolução da ONU denominou o período 2011-2020 como a Década de Ação pela Segurança no Trânsito. O Maio Amarelo surgiu do compromisso firmado por diferentes países - incluindo o Brasil - em propor diferentes medidas para reduzir a mortalidade no trânsito. Dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), no entanto, demonstram que a meta não foi alcançada: as mortes cresceram 13,5% em comparação com a década anterior.

O pesquisador do Ipea Carlos Henrique Ribeiro de Carvalho aponta que a diminuição da mortalidade ocorrida durante a crise econômica iniciada em 2015 não foi suficiente para reduzir a totalidade das mortes na década. "O problema é que o único período de queda foi muito em função dessa crise. Menos atividades econômicas geram menos circulação de bens e mercadorias e por consequência, menos acidentes", afirma.

O pesquisador da Unicamp na área de Engenharia de Transportes, Luiz Vicente Figueira Mello, aponta que o crescimento do número de sinistros de trânsito ocorrida durante a retomada da economia - no período pós-pandêmico - exige uma ação coordenada do Poder Público. Segundo o pesquisador, além das campanhas educativas, é necessário realizar uma intensa política de incentivo ao transporte público de qualidade. Segundo ele, os meios coletivos de locomoção precisam se tornar mais atrativo do que o transporte individual.

"Quando nós temos o uso intensivo dos automóveis e das motocicletas competindo por um espaço, os riscos são iminentes a qualquer momento", destaca Figueira Mello.

Duas rodas

O balanço do Ipea também indicou o aumento na mortalidade envolvendo motocicletas na última década. O período entre 2000 e 2009 registrou mais de 58 mil mortes de condutores desses veículos, enquanto a década de 2010 até 2019 registrou quase 119 mil mortes - um aumento de 103,6%. O pesquisador Carlos Henrique Ribeiro indica que dados mais recentes, do Atlas da Violência, indicam que esses números continuam a subir na década atual.

O pesquisador Luiz Vicente Figueira aponta que esse aumento está relacionado com o crescimento no número de viagens e entregas por plataformas - processo conhecido como uberização - que aumentou o número de veículos de duas rodas em circulação. Segundo ele, a atenção com esses veículos precisa ser ainda maior, já que costumam apresentar acidentes com maior gravidade.

"Quanto mais entregas eu faço de um determinado produto, mais eu vou ser remunerado, o que incentiva a maior velocidade. Por isso, é preciso realizar um trabalho junto às empresas de aplicativo para beneficiar as pessoas não só pelo volume de entregas, mas também pelo respeito da lei. Um tempo menor não significa que ele está fazendo um bom trabalho, significa que ele está fazendo um trabalho com risco maior", defendeu Figueira Mello.

Medo constante

Entregador por aplicativo, Daniel Freitas conta que começou a trabalhar na área antes da popularização das plataformas de entrega por aplicativo. A preocupação por uma vida mais sustentável o incentivou a se locomover através da bicicleta e, com o tempo, começou a prestar serviços de delivery. As empresas que o contrataram tinham como marca a preocupação com a baixa emissão de gases do efeito estufa nas entregas.

"A bicicleta funciona muito bem, não pega trânsito, não gasta dinheiro e não procura vaga", afirma. Ele explica que quando começou a andar com o veículo, em 2009, ainda existiam poucas ciclovias e ciclofaixas em espaços urbanos. Esse problema o obrigou a se arriscar em trechos perigosos - incluindo rodovias. Preocupado com o risco constante, começou a usar câmeras corporais.

"A primeira coisa que senti necessidade foi uma câmera. Eu tinha uma insegurança tão alta, que achava que ia morrer e queria que ficasse registrado que não foi minha culpa", afirma.

A também ciclista Camila Falcão indica que as coisas melhoraram com as ciclofaixas, mas ainda há muitos pontos a se avançar. "Nem todos os trechos em São Paulo tem e muitas vezes mesmo nesses espaços nós competimos com pessoas que usam diferentes veículos. Fora que existem algumas regiões que a gente vê que a ciclofaixa tá ali meio perdida. Você vai pela rota e ela termina em um lugar completamente aleatório, não tem conexão com outras vias", indica.

Políticas públicas

O pesquisador do Ipea Carlos Henrique Ribeiro defende que as políticas públicas passam por - além do já citado investimento no transporte público - melhoria das condições das ruas, avenidas e rodovias, campanhas educativas maciças e fiscalização. "Não dá pra discutir política de redução na mortalidade no trânsito, sem discutir campanhas educativas permanentes - e não apenas esporádicas ou eventuais", diz.

Ribeiro também defende a continuação e expansão das políticas de redução da velocidade e da Lei Seca, que - segundo os dados do Ipea - produziram resultados na última década. "Realmente, houve uma expansão do controle de velocidade por meio de equipamentos eletrônicos e maior rigidez na legislação", afirma. Os dados indicam que o período que vai de 2010 até 2019 apresentou uma redução de 21,9% no número de mortes por atropelamento.

O especialista ainda argumenta que o valor arrecadado com multas deve ser usado para custear investimentos e melhorias em vidas urbanas. "Muitas vezes esses recursos são usados para formar superávit primário, mas o destino principal deles seria para a educação e para melhor a gestão de trânsito", afirma.

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