Pilar do desenvolvimento de games no Brasil, São Paulo proporciona cada vez mais respaldo ao setor
29/08/2025 14:56 | Dia do Gamer | Gustavo Oreb - Fotos: Orbit Studio, Agência Alesp, Agência SP e Reprodução/Arquivo pessoal








Aproximadamente 83% da população brasileira têm o costume de jogar jogos digitais, segundo a Pesquisa Game Brasil de 2025. Os números impressionam, mas apenas refletem uma realidade que se constrói há tempo o bastante para desmistificar o verdadeiro significado dos videogames para a sociedade. No período em que começaram a se popularizar, nas décadas de 1980 e 1990, era comum que os consoles e games fossem associados à categoria dos brinquedos e produtos infantis, sem maiores contribuições culturais relevantes - mesmo que, desde aquela época, isso não fosse verdade.
Hoje, é seguro dizer que o cenário mudou completamente. Os videogames ocupam um espaço muito mais marcante e justo no imaginário popular, não só no Brasil, mas em todo o mundo. Afinal, os games representam a maior e mais lucrativa indústria de entretenimento do planeta, superando até mesmo outras mais tradicionais como a música e o cinema.
No entanto, esse protagonismo não veio da noite para o dia. Isso só foi possível a partir do impacto cultural expressivo que os jogos emplacaram ao longo dos anos, se afirmando como legítimas formas de arte e expressão, capazes de proporcionar experiências imersivas, narrativas complexas e momentos únicos, que criam laços emocionais com jogadores de todas as idades.
Não por acaso, esse reconhecimento crescente se converteu - e ainda se converte - na valorização dos profissionais responsáveis por essas obras interativas tão singulares: os desenvolvedores. Para se ter dimensão do tamanho que os jogos atingiram em âmbito nacional, já existem mais de mil empresas de games registradas por todo o Brasil, sendo pouco mais de 300 delas sediadas no estado de São Paulo - o maior polo de desenvolvimento do país, seguido por Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. Diante de um cenário tão vasto e rico em potencial, começaram a surgir, nos últimos anos, políticas públicas voltadas ao fomento da indústria e respaldo aos desenvolvedores brasileiros.
Exemplo evidente disso é o Plano Estadual de Desenvolvimento da Indústria de Games e Tecnologias Imersivas, anunciado no último mês de julho no estado de São Paulo. Elaborado pela Secretaria da Cultura, Economia e Indústria Criativas, o projeto visa investir, já em seu primeiro ano, R$ 8,2 milhões em editais destinados aos desenvolvedores independentes, além de incluir outras propostas de evolução para o segmento.
De acordo com a secretária da pasta, Marília Marton, o plano está organizado em cinco vertentes estruturantes: formação profissional e empregabilidade, que oferecerá cursos técnicos, criativos e de gestão ministrados por uma escola de Audiovisual, Games e Tecnologia; fomento e financiamento, pelo qual o montante de mais de R$ 8 milhões será disponibilizado via editais do ProAc para desenvolvimento, finalização e publicação de jogos; produção e distribuição, definido como um programa de aceleração para negócios criativos - com suporte de até R$ 50 mil por projeto; internacionalização, cujo objetivo é apoiar a participação de estúdios paulistas em eventos internacionais; e, por fim, governança, com a finalidade de monitorar indicadores do setor, em articulação com instituições como a Associação Brasileira das Desenvolvedoras de Jogos Digitais (Abragames) e a Associação Comercial e de Jogos Eletrônicos de São Paulo (ACJogos-SP).
"A elaboração do plano surgiu da percepção de que o setor já é uma potência criativa e econômica em São Paulo, mas precisava de uma política pública estruturada para crescer de forma sustentável", explica a secretária de Cultura. "Desde o início, ouvimos os desenvolvedores, estúdios independentes, associações e especialistas da área. Promovemos encontros, escutas públicas e diálogos constantes para que as propostas refletissem, de fato, as necessidades e expectativas de quem vive nesse mercado no dia a dia. O resultado é um projeto que está sendo construído de forma colaborativa, que reconhece os games e tecnologias imersivas como cultura e também como vetores de inovação, tecnologia e geração de empregos", acrescenta Marília Marton.
Efeitos
Antes mesmo do programa existir, porém, outras iniciativas de apoio ao setor de desenvolvimento de games já começavam a emergir do Poder Público estadual. "Produzir jogos no Brasil geralmente vem acompanhado de dificuldades financeiras, infelizmente. Mesmo os estúdios mais bem-sucedidos sempre estão batalhando para conseguir um fluxo de caixa saudável e espaço para divulgar seus projetos, muitas vezes por meio de financiamento coletivo, inclusive. Foi o nosso caso, há não muito tempo", conta o diretor de arte da já tradicional desenvolvedora independente Orbit Studio, Rodrigo Pascoal.
De acordo com ele, em 2024, a empresa viveu um momento crítico, de muitas dificuldades financeiras. Até que Rodrigo e sua equipe - composta por apenas quatro funcionários - ficaram sabendo de um edital da Cult SP. Eles se informaram sobre as regras de participação e se inscreveram com o conceito de um jogo novo totalmente original, após obterem sucesso entre público e crítica com os games "Retro Machina" (2021) e "Haunted House" (2023).
"Fato é que, quando estávamos prestes a entregar nossa sala de trabalho, num momento crucial, o resultado saiu e nosso projeto tinha sido aprovado. Dessa forma, conseguimos receber R$ 300 mil da Cultura de São Paulo. Agora, graças a isso, estamos transformando nossa visão em realidade, conseguindo levar nosso projeto para frente e melhorar o desenvolvimento. Aquilo foi um verdadeiro divisor de águas para salvar nosso estúdio", relembra o diretor, ressaltando que, sem o apoio público, não seria possível continuar tocando o atual projeto da empresa, chamado "Sky Dust".
Trecho do novo jogo da Orbit Studio: Sky Dust
"Foi por volta dessa época que estava começando a acabar o dinheiro que conseguimos juntar de outros projetos, nós já não sabíamos mais o que fazer. Então, veio esse aporte, e a partir dali conseguimos aproveitar tudo o que aprendemos nos outros games e começamos a fazer o jogo novo do jeito que realmente acreditamos. O processo ficou extremamente alinhado e, graças a esse investimento, voltamos a poder trabalhar com tranquilidade", pontua Rodrigo Pascoal.
São Paulo cyberpunk
Anunciado para o público em junho do ano passado na Gamescom Latam, Sky Dust é o atual e ambicioso projeto da Orbit Studio. Ambientado numa versão futurista da Capital paulista, o game mistura elementos de exploração, combate estratégico e aventura, tudo isso em um mundo aberto 2D repleto de vida, referências à cultura paulistana e personagens carismáticos. Todos esses aspectos não foram incluídos puramente por estética, mas sim para reforçar o sentimento de estar envolto pela maior metrópole da América Latina.
"No Sky Dust, nós tentamos mostrar o dia a dia das ruas de São Paulo, fizemos muitas pesquisas e fomos até lugares marcantes da cidade que vão aparecer no jogo, filmamos e pegamos o máximo de referências possível. Muitos filmes já retrataram a vida em São Paulo, mas, possibilitar às pessoas interagir com isso traz uma sensação totalmente diferente. Nós queremos mostrar o lado urbano do Brasil, aquilo que nós vivemos no cotidiano dessa cidade gigantesca", explica Rodrigo Pascoal.
Catedral da Sé em Sky Dust - Orbit Studio
Além de retratar o contexto atual da cidade em diversos trechos, o jogo se sobressai por apresentar um futuro distópico da Capital, com influências fortíssimas do gênero cyberpunk da ficção científica. Nesse tipo de narrativa, os avanços tecnológicos e cibernéticos do futuro coexistem com problemas de desigualdade social e qualidade de vida. Não há lugar melhor do que São Paulo para contar uma história como essa, na visão de Rodrigo.
"Nós já tínhamos a ideia de fazer algo que envolvesse narrativa e estética cyberpunk, e pensamos que São Paulo é perfeita para contar essa história no contexto brasileiro. O gênero dialoga diretamente com a realidade da nossa Capital do estado. O cyberpunk expõe, justamente, a alta tecnologia, desenvolvimento veloz, misturado com baixa qualidade de vida. São Paulo já é assim, uma cidade grande, moderna, mas, com muita desigualdade social. Basta qualquer saída na rua para se deparar com isso. Nós aproveitamos essa realidade não só para o visual do jogo, mas também para a história, para as críticas que queremos apontar", afirma o diretor de arte do game.
Mesmo sem data de lançamento prevista, Sky Dust é um dos jogos independentes mais promissores e aguardados no cenário nacional. Segundo Rodrigo, a participação ativa do público no desenvolvimento tem sido um fator fundamental para extrair do jogo todo o seu potencial. Dessa forma, quando for lançado, o produto irá refletir não apenas a visão dos criadores, mas também da comunidade.
"Nós acreditamos demais nesse projeto e estamos gostando muito de fazê-lo. Desde o começo do Sky Dust, temos mostrado bastante do game, os primeiros cenários, personagens, e o feedback do público, além de incentivar, também nos ajuda a construir o jogo. Conseguimos criar uma estética muito boa, que mistura pixel-art 2D com modelagem 3D, isso deixa os cenários e a iluminação bem interessantes e cheios de possibilidades", destaca Rodrigo, empolgado.
Ambiente central de São Paulo representado em Sky Dust - Orbit Studio
Expoente cultural
Atualmente, a indústria brasileira de games vive, possivelmente, seu melhor momento histórico, tanto em termos de tamanho e produção criativa quanto de lucro e apoio estatal. Entretanto, o cenário ainda é relativamente jovem e se concentra em empresas independentes, cujo alcance depende, muitas vezes, de parcerias com publicadoras estrangeiras. Para Rodrigo Pascoal, o potencial dos jogos brasileiros de exportar cultura está apenas começando a ser visto e aproveitado.
"Acredito que o cenário já melhorou bastante de uns anos para cá. Vejo que as pessoas estão começando a enxergar que o videogame pode ser um mercado grande para o Brasil, não só em lucro, mas também gerando um tipo de soft power para o país. Basta observar Japão e Coreia do Sul, quantas pessoas conhecem a cultura desses países por meio da música, filmes e videogames?", pondera ele. "Eu tenho certeza de que esse é um caminho que pode levar o Brasil para outros lugares do mundo para disseminar nossa cultura. O videogame é um jeito diferente de mostrar a cultura do Brasil, é uma linguagem diferente, interativa, que ensina, mesmo sem parecer que está ensinando", completa o desenvolvedor.
Pascoal exemplifica sua visão, também, na história de países europeus, "de primeiro mundo", que olharam para o mercado de videogames como formas reais de propagar suas culturas e tradições, ao mesmo tempo que geraram empregos e alavancaram a economia local.
"A Polônia, com a série The Witcher, é um caso emblemático. Sem esses jogos, eu não saberia te dizer nada daquele lugar além da Segunda Guerra Mundial. Para eles, os videogames são motivo de orgulho e representam a cultura do país. E ainda tem outros exemplos grandes disso, como a Remedy Entertainment, desenvolvedora da Finlândia. São todos países bem desenvolvidos e estruturados que olharam para os games com atenção e foram recompensados por isso com geração de empregos e renda. Eu penso que o Brasil tem bastante pano para manga para chegar no mesmo patamar. Nós somos o maior expoente cultural da língua portuguesa, e podemos aproveitar isso muito mais", ressalta Rodrigo.
The Witcher 3 - jogo polonês do estúdio CD Projekt Red, motivo de orgulho para a cultura do país
Segundo Marília Marton, essa visão está sendo contemplada pela pasta estadual de Cultura, que visa apoiar desde estúdios iniciantes até empresas mais consolidadas no mercado, que podem dar um salto de crescimento por meio do suporte do governo.
"O objetivo é contemplar diferentes perfis do setor, sempre com critérios técnicos de seleção, como a relevância cultural, a inovação e o potencial de impacto econômico e social dos projetos. Também buscamos garantir diversidade, dando oportunidade para novos talentos e consolidando a indústria paulista de games como referência", aponta ela.
A secretária também destacou o Marco Legal dos Jogos Eletrônicos - legislação nacional em vigor desde 2024 - como um referencial para a elaboração das políticas voltadas ao desenvolvimento de games em São Paulo. "O plano está alinhado com essa legislação federal, inclusive no que diz respeito à diferenciação entre games e jogos de azar", frisa Marília Marton.
Consolidação
Como forma de garantir que esse tipo de política permaneça e atravesse os diferentes governos que virão, Rodrigo Pascoal diz acreditar que a legislação e o investimento em institutos públicos são caminhos viáveis para promover o crescimento saudável da indústria de games brasileira.
"Para além do suporte financeiro, que é absolutamente fundamental, o investimento em propagar conhecimento deve ser uma das prioridades do governo quando se pensa no desenvolvimento de videogames. É um mercado muito empolgante, mas ainda sinto que falta instrução e estrutura para muita gente ingressar nesse mundo. A criação de um instituto focado nisso, ou mesmo de leis que assegurem medidas como a da Secretaria da Cultura podem ser caminhos para fazer nossa indústria crescer a longo prazo e, quem sabe, dar um salto do mundo indie para algo ainda maior", projeta o diretor da Orbit Studio.
A linha de pensamento por trás da Secretaria estadual da Cultura e do Plano de Desenvolvimento da Indústria de Games é exatamente essa, nas palavras de Marília. "Não se trata apenas de uma ação política do governo, e sim uma política pública robusta de Estado, que queremos que ultrapasse mandatos e se consolide como referência para o setor. Para isso, estamos em diálogo constante com a Alesp e com a sociedade civil, avaliando mecanismos que deem mais segurança e perenidade às ações, inclusive por meio de propostas legislativas. O mais importante é garantir que esse ecossistema, que já é tão promissor, continue recebendo apoio e investimentos a longo prazo", conclui a secretária.
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