São Paulo teve papel importante na popularização do rádio, defende historiador

Na esteira do modernismo, primeiras emissoras paulistas trouxeram programas populares nos anos 1920, época marcada pela hegemonia do que era considerado "alta cultura"; São Paulo guarda histórias na radiodifusão que atravessam décadas e gerações
25/09/2025 16:48 | Dia Nacional do Rádio | Gabriel Eid - Fotos: Rovena Rosa/Agência Brasil, Acervo Maycon Vieira e Carlos Amaral

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Equipamento antigo de rádio em exposição no MIS<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-09-2025/fg353451.webp' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Rádio Educadora Paulista na Revista Rádio (1924)<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-09-2025/fg353452.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Anúncio na Revista Rádio (1924)<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-09-2025/fg353453.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Carlos Amaral: uma vida dedicada à rádio<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-09-2025/fg353454.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a>

Transmitir o som entre diferentes aparelhos sem conexão por fio - algo que pode parecer extremamente banal nos dias atuais - foi uma das principais novidades do país na década de 1920. A primeira emissora regular de rádio do Brasil foi a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, fundada por Roquette Pinto em 1923.

O estado de São Paulo, ainda no mesmo ano, recebeu a sua primeira emissora: A Rádio Educadora Paulista. O historiador e especialista em história social pela USP, Maycon Vieira dos Santos, conta que as estações da época ainda não tinham um caráter comercial por conta da proibição da veiculação de propagandas.

As transmissões eram realizadas em formato de sociedade, sendo necessário o pagamento anual para receber as transmissões. Além disso, o senso geral dos pioneiros da rádio era a de que o novo aparelho poderia trazer educação para toda a população - apesar de apenas a alta sociedade ter condições financeiras de ter um aparelho e pagar as anuidades das emissoras.

O historiador complementa que a noção de educação que se tinha na época era a de que apenas a cultura e músicas clássicas poderiam ser veiculadas nas rádios. "Essa ideia de educação estava muito ligada a levar às massas 'aquilo que elas não têm'", afirma.

O historiador indica que São Paulo - ainda influenciado pelos movimentos da Semana de Arte Moderna -, foi na contramão disso e deu espaço para os primeiros programas populares. Polkas, valsas, choros, sambas, emboladas, cateretês eram gêneros musicais que se destacaram nestes programas, chamados de "regionais".

"Isso tem a ver um pouco com o contexto histórico dessa São Paulo que quer se modernizar e a rádio vai refletir um pouco isso. E também o contexto do modernismo brasileiro e dessas discussões do que é o Brasil, do que é o popular", defende Santos.

A fundação da Rádio Record em 1928 foi outro marco no cenário paulista e representou a expansão de programas populares. "Ela vai padronizar o formato dos programas, ter programas infantis, trazer uma ideia de uma emissora próxima do ouvinte e popular." O slogan utilizado era a do "amigo ouvinte" para reforçar a proximidade com o público.

O historiador compara o impacto gerado pelos primeiros anos do rádio com o gerado pelo surgimento das redes sociais nos anos 1990. Ele aponta a sensação de otimismo inicial trazida pelas tecnologias e, ao mesmo tempo, a desilusão gerada pelos seus problemas.

"O rádio era para aquelas pessoas o que hoje são as redes sociais. E, claro, entendendo qual é o impacto que isso causa nas nossas vidas tanto no sentido positivo quanto do negativo", afirma. O historiador se refere ao uso intenso do veículo pelo nazifascismo europeu e pelo Estado Novo brasileiro como meio de propagar suas ideias, da mesma forma que nos dias de hoje as redes sociais são usadas por extremistas políticos.

Função educadora

Na década de 1930, a permissão da veiculação de propagandas trouxe dinheiro, inovações tecnológicas e a massificação da rádio, não só em São Paulo como em todo o Brasil. O meio passou a ser mais acessível e veicular programas de entretenimento, como novelas. As estações se multiplicaram pelo país e criaram programas memoráveis, que constituíram a chamada "era de ouro" da Rádio.

Nos dias atuais, o radialista de Ribeirão Preto com quase 50 anos de trabalho na área, José Marcos Posca, acredita que a programação precisa resgatar um pouco a ideia de que a rádio pode contribuir com a educação e não só com o lucro.

Posca, que também integra o Sindicato dos Radialistas do Estado de São Paulo, aponta que o meio cumpre um papel fundamental na propagação da cultura popular e regional e no fortalecimento das comunidades locais. De acordo com ele, essa cultura vêm enfrentando dificuldades nos últimos anos, com a ampliação das transmissões por satélite irradiadas a partir das grandes capitais.

Por isso, segundo ele, é tão importante a preservação das emissoras regionais. "O rádio voltado para a comunidade local é de suma importância", afirma.

Atravessando gerações

Carlos Amaral é coordenador técnico da Rádio Eldorado de São Paulo e guarda uma longa história familiar no ofício, que inclui avô, pai e tios. Ele conta que o seu avô começou a trabalhar, também na área técnica, nos anos 1960 e abriu caminho para uma tradição familiar na área.

Desde criança esteve próximo do universo e foi incentivado pelos familiares a seguir na carreira, como sempre foi o seu desejo. A paixão já começa pela data do seu aniversário, comemorado no Dia Nacional do Rádio. "Quando eu entrava no estúdio eu ficava até assustado porque os equipamentos eram todos enormes. E eu fiquei encantado. Falava para o meu pai que queria trabalhar lá."

O radialista explica que o meio de comunicação tem um potencial de estar em diversos lugares e comunicar de uma forma muito rápida. Por isso, segundo ele, por mais que passe por mudanças tecnológicas sempre vai continuar tendo relevância e cumprindo o seu papel. "Eu acho que o rádio é um companheiro. Ele ainda mexe com sua memória e imaginação", define.

Carlos Amaral indica que o meio precisa se adaptar às novas tecnologias para se reinventar, como no caso das transmissões em vídeo que já acontecem em diversas emissoras. "O rádio ainda não perdeu a essência. Ele tem só um brilho a mais que é a imagem."

alesp